8.5.06

7

7.
O céu é tão grande, visto aqui de baixo. E é maior se nos deitarmos na relva e olharmos assim para ele. Aquele azul todo quase nos cai em cima... Mas se fecharmos os olhos o mundo que vemos é maior. Abarca tudo. Tudo o que se não vê está lá, dentro dos olhos. Vê-se o que se vê e vê-se o que não se pode ver. Se abrirmos os nossos olhos é diferente. Vemos o céu e as árvores que estão à nossa frente, mas não se vê mais nada. Os olhos não vêem para lá daquela montanha ou dentro daquele rio. Por tudo isso, fecho os olhos e vejo tudo o que quero. Sou o comandante do mundo, o mágico que faz nascer das mãos tudo o que deseja. Ser mágico é desejar. Quem deseja é mágico, porque imagina e tem, nesse momento, o fruto das coisas nas suas mãos. Até Deus se pode ter entre os dedos se se desejar. Mas é difícil. Porque talvez ele não queira ser perturbado do seu sono eterno. Deus gosta, afinal, de estar sozinho. Mas não consegue porque está em todo o lado e, por isso, tem sempre companhia. Nem que seja a da luz ou a do silêncio ou a do escuro. Nunca está só, o seu corpo santo. Talvez por isso ele seja assim, triste. E talvez por isso ele se zangue com o vento ou com a chuva que não o deixam descansar em silêncio. E pune os homens. Os homens têm culpa de tudo. São eles que o irritam quando escarnecem dele e dizem que não existe. Quando não têm fé mas têm medo. Deus não os compreende. Eu também não os compreendo: se dizem que não há Deus, então porque têm medo? Não percebo os homens mesmo nada. São criaturas muito estranhas. E recolhidas. Não voam, como as aves, por si. Se o tentam, caem. E isso dói às vezes. Deus não cai porque é ave. Deus não tem medo. Medo de quê e de quem, se ele é tudo e todos? Deus voa. Os homens também deveriam voar, porque são Deus. Mas, porque não voam, têm, à vezes, alguma inveja dele, e, por isso, escarnecem e dizem palavras menos próprias e agem como crianças pequenas: sujam as mãos e depois não limpam a lama que lhes fica entranhada na pele. Os homens pecam e depois sentem-se mal. Mas continuam a pecar. Não percebo. Não percebo mesmo nada.